ETAPAS DE UMA HISTÓRIA

PrÉ-histÓria

A região onde se encontra hoje o concelho de Oliveira do Hospital é habitada desde a pré-história, uma vez que abundam pelo concelho vestígios megalíticos (nomeadamente nas freguesias de Bobadela, Ervedal da Beira e Seixo da Beira).
Na verdade, a arte megalítica da Beira Alta está bem representada em antas ou dólmenes (monumentos fúnebres constituídos por grandes blocos de pedra cravados no solo) de grandes dimensões e geralmente com corredor (o que deixa pensar que esta arte megalítica pertence a um momento inicial do megalitismo regional). Apesar desta arte também ser testemunhável em todo o noroeste peninsular, no oeste da França, no Bassin Parisien, na Irlanda e na Grã-Bretanha, na Beira Alta, ela tem, no entanto, a particularidade única no mundo de se exprimir, entre outras formas, pela pintura, resumindo-se a alguns motivos e cobrindo alguns ou todos os esteios ou ainda cobrindo toda a superfície dos megalitos.
Com efeito, esta arte megalítica beirã é uma arte abstracta que combina motivos es­quemáticos, seminaturalistas e simbólicos, com figuras humanas, representação da pele esticada dum animal, fiadas de triângulos ou de "V", motivos em dente de serra e serpentiformes horizontais . Certos elementos são comuns a outras regiões da Europa. É o caso dos serpentiformes, dos sóis, das figuras em "U", dos círculos concêntricos e das "fossettes", que se explicariam por contactos inter-regionais.
Os investigadores pensam que as representações gráficas dos megalitos podiam ter um sentido religioso, e servir de enquadramento a ritos que aí se processariam. Nesse âmbito, as cenas narrativas como a dos Juncais poderiam ser alusões a acontecimentos mitológicos, cuja natureza nos escapa. Pôs-se também a hipótese de o ritual da pintura e da gravura dos monumentos do centro de Portugal e do noroeste peninsular, de uma forma mais geral, ter a mesma função que as placas de xisto e outros objectos gravados do Sul. Deste modo, considerar-se-iam como itens de prestígio de certas linhagens que acentuavam a sua liderança sobre a comunidade, enterrando os seus membros em monumentos de maiores dimensões. Denunciariam então um incremento da hierarquização das comunidades neolíticas.


Do PerÍodo Romano À Reconquista
(Cf. LOURENÇO, Sandra, O povoamento alto-medieval entre os rios Dão e Alva, pp. 23-26)

Na época romana, a maioria do território em estudo integrava-se na civitas da Bobadela com a capital na povoação que lhe dá o mesmo nome, no actual concelho de Oliveira do Hospital, como o confirma a inscrição, CIL II 397, a qual refere-se-lhe dando-lhe o nome de splendidissima civitas.
A ocidente da cidade romana da Bobadela haveria uma ligação à via de Olisipo a Bracara e um outro acesso a Viseu, enquanto a oriente sairia uma nova via que entroncaria na estrada que ligava Emerita a Viseu. Jorge de Alarcão levanta ainda a hipótese da existência de uma outra estrada, que passaria pelo vale do rio Alva, estabelecendo a ligação mais curta entre Aeminium e Bobadela (Alarcão, 1988a, p. 104-105).
À luz do Parochiale Suévico, um texto redigido no século VI, entre 572 e 582, que estabelece a organização eclesiástica do reino suévico, Jorge de Alarcão parte do princípio de que uma vez que as designações das paróquias são na maioria latinas ou pré-latinas, sendo escassas as designações germânicas, estas “…correspondem a aglomerados urbanos já existentes e importantes na época romana, aglomerados que terão conservado, na época suévica, os seus primitivos nomes, eventualmente já com alguma alteração fonética ou ortográfica.” (Alarcão, 2000, p. 29). Para além deste último pressuposto, refere um outro, o de que existe uma ordem geográfica na enumeração das paróquias, e com base neste coloca a hipótese, ainda que com pouca convicção, da cidade romana capital da civitas da Bobadela, cujo nome romano desconhecemos, corresponder a Rodomiro.
Infelizmente os dados arqueológicos que se conhecem desta civitas romana, que certamente não terá deixado de ser ocupada, aliás ainda hoje é sede de freguesia, são muito escassos. Estes últimos, resumem-se a alguns dos resultados das escavações arqueológicas realizadas no anfiteatro, tendo-se atribuído aos vestígios detectados uma cronologia entre inícios do século I d.C. e uma “... época de difícil precisão cronológica, mas seguramente posterior aos finais do século IV...” (Portas e Frade, 1989, p. 384-385). Não é, por exemplo, de relegar o achado do jarro litúrgico visigótico na década de 60 do século XX, durante a abertura de fundações para uma casa, na povoação de Bobadela (Gomes e Dias, 1995, p. 91-99). A possibilidade de Bobadela ter-se mantido um importante centro religioso após a queda do império romano é proposta pelos investigadores que publicaram este achado e a respectiva inscrição nela patente, sobre a qual propõem duas leituras: a S(ancta) Aecles «i» a Ies(u) Ch(rist) i.; a S( anct)a Ecles «i» a Ies (u) Ch(rist) i. (Gomes e Dias, 1995, p. 95-98). Este jarro e a sua inscrição relacionada com o ritual eucarístico, parecem pois corroborar a hipótese de Bobadela ter sido paróquia.
A área definida entre os rios Dão e Alva, integra-se numa região frequentada quer por cristãos, quer por muçulmanos, nos séculos VIII ao XII, sendo durante este tempo palco de várias disputas territoriais, cronologicamente coevas das sepulturas rupestres e da construção da Igreja de S. Pedro da Lourosa (principal representante do estilo moçárabe em Portugal).
Com o reinado de Afonso III das Astúrias (866-909), na segunda metade do século IX, a reconquista cristã vive um novo dinamismo, que conduziu a uma importante reorganização militar e administrativa. Assim, a partir da viragem do 3° para o 4° quartel do século IX os documentos começam a referir-se aos territoria, o de Braga, o de Portucale e o de Coimbra, e a algumas civitates. Os primeiros “... eram grandes unidades geográficas onde se verifica uma coincidência entre as vertentes administrativas, religiosa e militar, apoiando-se em grande parte na divisão diocesana (Braga, Porto e Coimbra) e corporizando-se cada um na mais importante urbe do seu âmbito geográfico, as sedes episcopais. A sua vastidão geográfica impunha a existência de múltiplos castelos no seu espaço” (Barroca, 1990-1991, p. 92). Os segundos, são grandes unidades territoriais onde um castelo presidia aos destinos militares, não possuíam correspondência com a divisão eclesiástica e respeitavam sobretudo critérios militares. Mário Barroca acrescenta ainda “...que a existência das civitates não implicava que uma determinada área geográfica não se incluísse simultaneamente dentro de um territorium...” (Barroca, 1990-1991, p. 92), como acontecia com as civitates de Anegia e Santa Maria, ambas do territorium de Portucale.
Este modelo condal de organização militar, implica “... um lugar central, confiado ao governo de um Conde ou Dux, com uma estrutura militar incipiente, quase sem arquitectura, essencialmente construída com recurso à movimentação de terras e à criação de taludes, com muralhas em pedra seca ou mamposteria, sem silhares aparelhados, e subordinado a esse lugar central, um vasto território envolvente, onde se desenvolviam e conviviam outras estruturas militares, erguidas pelas populações locais para a sua defesa.” (Barroca, 2000a, p. 216). Assim, a documentação medieval refere-se entre outras às civitates de Lamego, Coimbra e Seia (Barroca, 2000a, p. 216).
Tal modelo condal de organização do território, será substituido aquando da reconquista definitiva de Coimbra em meados do século XI, por Fernando I, o Magno (1033-1065), que instituirá um  modelo senhorial apoiado em territórios mais pequenos designados na documentação medieval por Terras (Barroca, 2000a, p. 219). Entre os rios Dão e Alva, temos nos séculos XI e XII referências às terras de Senhorim, de Sena e de Zurara (Merêa e Girão, 1943, p. 28-31).


Nascimento do Concelho de Oliveira do Hospital

No primeiro quartel do século XII existia em terras de Seia, uma insignificante povoação, tendo a Este a aldeia denominada Sampaio de Garamácios e a Oeste a conhecida pelo nome de Bonadela, que se situava no pendor Sudoeste duma colina, em cujo sopé meridional se estendia um comprido vale de terreno alagadiço e pantanoso. Foi dessa grande ulveira, que a povoação a que nos referimos tomou o nome, designando-se inicialmente por Ulveira e daqui, por analogia e deturpação, começou a usar-se Oliveira.
A designação “de Hospital” que se associará a esta povoação resulta da existência de uma Comenda da Ordem dos Hospitalários de São João de Jerusalém, também conhecida por Ordem de Malta, concedida pela rainha D. Teresa, mãe de D. Afonso Henriques, por volta de 1120, e situada entre Ulveira e Bovadela. Esta Comenda, acrescentada com doações de particulares, veio a ser muito importante e opulenta, muito devido ao génio activo dos seus habitantes e da abundância e fertilidade do seu terreno cuidadosamente explorado.
Na verdade, citam-se, como seus comendadores: D. Martim Garcia, D. Urraca Sanches, irmã da Rainha Santa Mafalda e D. Manuel de Noronha. Por outro lado, entre os varões ilustres que, por seus feitos, honraram esta Terra, avulta a figura do oliveirense Frei André do Amaral, aio do Rei D. Manuel II, que serviu em altos cargos e, como General das Galés de Religião, e se bateu contra os turcos com raro heroísmo. Descendia de Domingos Joannes, fundador da Capela dos Ferreiros, monumento nacional muito apreciado pelas suas estátuas tumulares do séc. XIII ou XIV, retábulo e bela estátua de um cavaleiro na sua montada que, segundo se crê, representa o próprio Domingos Joannes. Esta estátua foi, há muito, baptizada como “Cavaleiro de Oliveira” e representa o grande ex-libris desta terra e deste concelho. Desta Capela, actualmente incorporada na Igreja Matriz, diz o escritor Miguel Torga: “Quem quiser ver a Idade Média ao natural, venha aqui, a esta Capela dos Ferreiros. A cavalaria, a religião e o amor, tudo na sua pureza natural”.
Oliveira do Hospital recebeu Foral da sua Donatária, a Ordem do Hospital, concedendo-lhe D. Manuel I um novo Foral em 27 de Fevereiro de 1514.
Quando D. João III mandou fazer o Cadastro de População do seu reino (o primeiro que é conhecido) existiam na área do actual concelho de Oliveira do Hospital, além desta, mais as seguintes vilas ou concelhos: Avô, Bobadela, Lagares, Lageosa, Lagos, Lourosa, Nogueira, Penalva de Riba d'Alva, São Sebastião de Riba d'Alva, Seixo e Vila Pouca da Beira - o concelho de Oliveira do Hospital era então mais pequeno do que a sua actual paróquia.
No século XVII já lhe pertencia a pequena paróquia de Lajeosa, mas foi durante o século XIX, com as sucessivas reformas de âmbito administrativo e judicial que, pela extinção dos pequenos concelhos limítrofes de Lagares, Lagos da Beira, Nogueira do Cravo e Bobadela, o concelho de Oliveira do Hospital ficou com nove Freguesias e, mais tarde ainda, pela extinção dos Concelhos de Penalva de Alva, Ervedal da Beira, Avô e S. Gião, que ficou com um total de vinte Freguesias. A partir de então o concelho de Oliveira do Hospital ficou praticamente com a área actual até 1988, ano em que foi criada a mais nova freguesia de Vila Franca da Beira por desanexação de um lugar da freguesia de Ervedal da Beira. E assim se formou o extenso concelho de Oliveira do Hospital, com vinte e uma Freguesias e com 234,55 km2.
Oliveira do Hospital foi berço de notáveis poetas, músicos, escultores, historiadores e cavaleiros: Domingues Joannes (séc. XIII), Frei André Amaral (1540-1523), Brás Garcia de Mascarenhas (1596-1656), Dr. António Ribeiro Garcia de Vasconcelos (1860-1941), Dr. Adelino de Abreu (1869-19..), Manuel Cid Teles (1911-2009), entre outros.